segunda-feira, maio 30, 2005

Triste, triste, sozinho, sozinho...

Ando a ler Camões, o cara das Lusíadas e da música chata do Legião.

"Busque Amor novas artes, novo engenho
Para matar-me, e novas esquivanças;
Que não pode tirar-me as esperanças,
Que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
Andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
Onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como e dói não sei porquê."

p.s: sim, colagem de poesias porque não sei o que postar.

escrito ao som de Luiz Melodia - Pérola Negra

Jornada

Nada é novo em meus sentimentos. Mesmo assim, eu escrevo. Nada tenho a dizer a ninguém, senão que sofro, e sei que o sofrimento de um homem desinteressante não é motivo para que algum leitor incauto perpasse minhas linhas e sinta-se reconfortado. Mesmo assim, eu escrevo. Sei que de palavras repetidas e sentimentos banais as enciclopédias, os dicionários, os livros de auto-ajuda e mesmo os romances mais vagabundos estão cheios, e que de minhas reflexões só sairão as dúvidas mais corriqueiras, as mesmas que qualquer um já teve antes de completar os dez anos de idade. Mesmo assim, eu escrevo. Não pelo reconhecimento, que muito me agradaria mas reconheço ser impossível - visto que sou revestido da mais absoluta mediocridade no manuseio das palavras -; não pela recepção calorosa do leitor, que julgo bastante improvável; não por algum outro motivo mais misterioso ou extravagante. Escrevo porque preciso. E mesmo assim.

sexta-feira, maio 27, 2005

Vi "A Queda"...

e o filme não é sobre hitler.
o filme não é nem sequer sobre o nazismo.

o filme é sobre como se age quando seus sonhos não se realizam, sua guerra é perdida, sua ideologia desaba. uns se matam, outros se rendem, outros continuam lutando, contra o nada.

são todos humanos no filme - hitler incluso -.
não porque o ditador amava cachorros e crianças, mas porque seus atos monstruosos partiam de um sonho, uma idéia de humanidade perfeita. (hitler, no filme, não se preocupa em ser o ditador supremo do mundo, e sim em ter um mundo como acredita).

cheguei a ter pena dos nazistas, mesmo sendo judeu.
ver a guerra do lado do perdedor é sempre desagradavel.
no filme, são todos humanos, e isso perturba.

porque as guerras, todas elas, vêm de homens. e cada plano do filme lembra isso.

p.s: não que eu tenha gostado propriamente do filme. ele tem vários defeitos sérios. mas o post não é sobre isso.

p.p.s: depois de ver a queda, voltei, levemente bêbado, para casa e no meio da rua levei um tombão. me arranhei todo e, por sorte, não fui atropelado. decidi que o próximo filme que for ver no cinema vai se chamar algo como "o grande pegador de mulheres". quem sabe não dou sorte?

escrito ao som de The Zombies - Absolutely The Best

quarta-feira, maio 25, 2005

Planos, Planos, Planos...

meus planos feitos nos últimos anos, meses, dias:

dirigir o um amor de família, dirigir o elo partido, dirigir o filme da velhinha assassina, escrever e dirigir a homenagem ao affonso brazza, escrever e dirigir mais alguma coisa qualquer (porque eu sou mais talentoso e modesto que 90 por cento da minha faculdade e mereço), fazer um programa revolucionário na unitevê e ainda ficar com 10 na matéria, fazer um programa qualquer na unitevê para recuperar o zero, fazer o narguilê e culinária na unitevê mesmo sabendo que aquele zero vai ficar lá pra sempre, criar um site de cinema du caralho, criar um blog de cinema mais ou menos, ver um filme por dia pelo menos, sair da internet e ir ler um livro, escrever um livro (ou pelo menos um conto decente), ensaiar uma vez por semana com o naipe em braile, voltar a ensaiar com o naipe em braile, arranjar uma namorada, arranjar um mp3 player, ser menos preguiçoso, ser menos displiscente, ser menos chato, enfim, um bando de coisas.

nenhuma realizada, óbvio.

dia desses, decidi que seria legal fundar um cineclube.
a proposta inda está em aberto.
alguém a fim de participar?

escrito ao som de Gal Costa - Cantar

domingo, maio 22, 2005

Poema Falso e Indignado

queria chorar mas não posso
não há por que chorar
o tempo dirá se a vida tem sido boa comigo
o tempo dirá e eu fico calado
pois nada tenho a dizer
não sei se sou hoje o mesmo eu que hoje sou
provavelmente sim – mas não admito
e amanhã também
e depois de amanhã
o tempo dirá se respondi certo as questões que nunca fiz
o tempo dirá e eu não tenho nada a dizer
fico calado
como quem olha o calendário esperando que marque o dia de ontem
o relógio a hora de ontem
a janela o tempo de ontem
mas o tempo é hoje e nada posso fazer
queria chorar, mas nem chorar eu posso

alguém tenta me mostrar algo
um jardim, uma rua, uma verdade
não me atrevo a perguntar
tenho talvez mais medo da pergunta do que da resposta
ou mais medo de qualquer coisa que não sei
pois não sei de nada
e tampouco sei se isso me deixa feliz
portanto, durmo
triste ou alegremente
tanto faz
o importante é que durmo
e quando se dorme as perguntas e respostas estão todas embaralhadas
e ninguém sabe de nada

as madrugadas em claro
os olhos abertos, as luzes ligadas
o claro no escuro
e a alma
enterrada
na semana passada
no mês passado
no ano passado
talvez em meados de dezembro de alguns anos atrás
passada e engomada e pendurada no guarda-roupa
onde ela cabe, aliás, muito bem
junto dos ternos que nunca usei e nem sei por que tenho

escrito ao som de The Kinks - Village Green Preservation Society

sábado, maio 21, 2005

Garçom, aqui nessa mesa de bar...

Tenho uma confissão a fazer: meu espírito, no fundo, fundo mesmo, é brega. No sentido sentimental da palavra, mesmo. Finjo que não, mas tenho profunda admiração por aqueles que mandam a vergonha às favas e choram no meio-fio, ancorados por uma garrafa de cachaça. Que mandam a razão às favas e pensam o dia inteiro na garota que tá dando pro melhor amigo, só porque tá dando pro melhor amigo. Que mandam o senso crítico às favas e cantam, bêbados, a altos brados, Reginaldo Rossi. Cafona sim, e daí? É a alma interiorana brasileira. O blues do sertanejo. Temos de recuperar o samba-canção dos anos 30 e 40, o coração dilacerado, a alma em pedaços. Xô bossa-nova. Essa carioquice não tá com nada...

Mas tô confessando isso porque, um dia, voltando de Nikiti, brincando de fazer jogos de palavras, me saí com essa: "Quando a barca parte, parte meu coração". É brega, eu sei. É clichê. Mas foda-se. Eu curti. E chorei. E sofri. E o importante é que emoções eu vivi.

Taí. "Quando a barca parte, parte meu coração". Vou lá na Biblioteca Nacional registrar e, no caminho de volta, compro uma garrafa de cachaça, abraço um mendigo e, bêbado, saio gritando que Odair José é gênio.

escrito ao som de Luiz Melodia - Pérola Negra

sexta-feira, maio 20, 2005

Maturidade

I

Um dia, o coração cansou. Parou de bater e adormeceu, sossegadamente, no peito acolchoado do homem.

O Homem, por sua vez, contando as moedas para pagar a conta de luz, continuou a viver como se nada houvesse acontecido.

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Quem visitou meu blog nas últimas horas deve ter reparado que havia um arremedo de poesia nesse espaço. Ele era, porém, quase um plágio (malfeito, inda por cima) de uma, bem melhor, da Diana. As poesias da Diana são inspiração constante minha, admito, mas dessa vez eu exagerei. Portanto, entrem no blog dela e exijam o poema original, que deve estar desaparecido no seu quarto depois do fim do Estilhaços. Ou melhor, exijam logo o livro mesmo. Tá na hora.

escrito ao som de Damien Rice - O

terça-feira, maio 17, 2005

O Passado Nos Condena

Dia desses, ao errar minha senha de entrada no Blogger, me deparei com um passado que - felizmente - há muito estava esquecido. Apresentou-se na minha frente a existência de um blog que fiz com amigos para presentear o mundo com nosso inestimável talento. Contos antigos que eu teimava em apagar, como traumas, do meu cérebro, surgiram na tela iluminada do computador. Diretamente da flor de meus 16 anos. Diretamente do tempo em que eu achava que era gênio (posso afirmar, hoje, com convicção, que estava totalmente errado). Os contos não são pouco ruins, são muito. Mas tudo bem, faz parte da vida, acontece...

Engraçado é pensar que, daqui a três anos, eu devo estar com essas mesmas idéias sobre a minha mentalidade atual, os meus escritos atuais, a minha vida atual. E provavelmente estarei com razão. Mas, no fundo, e daí? Enquanto isso, eu vou me divirtindo, presenteando o mundo com meu inestimável talento. E falta de senso crítico.

Ah, e como sei rir de mim, taí o endereço, diretamente do túnel do tempo:
www.contemporaneos.blogspot.com

Os meus continhos estão lá embaixo. Divirtam-se!

escrito ao som de Erasmo Carlos - Banda dos Contentes

sexta-feira, maio 13, 2005

Reflexão da Noite

A verdade é que sou mesmo o típico burguês contemporâneo.

Egoísta, individualista, superficial. Sem sentimentos nem aflições.

Mesmo me sentindo mal, apertando o peito, usando a mesma camisa branca todos os dias, indo pra faculdade pública, torcendo para que a realidade do mundo seja outra, dizendo não, não sou. Mesmo assim.

Hoje percebi que quando estou triste, muito triste, triste mesmo, é só deitar que passa.

Minha tristeza é sono.

Por sinal, preciso dormir. Corre o risco de, se eu passar a noite em claro, me apaixonar.

escrito ao som Crosby, Stills, Nash and Young - Deja Vu

quinta-feira, maio 12, 2005

Conto Moral

João foi uma criança infeliz. Angustiada. Insatisfeita. João queria mesmo era achar o sentido da existência. Não achou.

João foi um adolescente infeliz. Angustiado. Insatisfeito. João queria mesmo era conseguir mudar o mundo. Não conseguiu.

João foi um jovem infeliz. Angustiado. Insatisfeito. João queria mesmo era encontrar a paixão de sua vida. Não encontrou.

João terminou a faculdade, arranjou um emprego razoável e burocrático. Chegou sempre na hora, fez horas extras, nunca disse não ao chefe, à mulher, às crianças, pagou todos os impostos em dia, elegeu um presidente, levou seu cachorro para passear no quarteirão, arranjou uma amante.

João quer mesmo é poder assistir o futebol na televisão aos domingos. Pode. A angústia em seu peito já secou, há alguns anos.

João é, enfim, um adulto feliz.

escrito ao som de Bix Beiderbeck

terça-feira, maio 10, 2005

Anjos Decaídos

Todos meus anjos de barro
Tiram sarro
De mim
Eu tão descrente e descuidado
Andando ao lado
De algum querubim
Com os meus pés calejados
De tanto pisar
Em campos de jasmim

Todos meus anjos tão certos
Espertos
Até demais
Me deixam defronte ao deserto
Achando que eu
Nem vá olhar pra trás
Com minha mente poluída
De tanto engolir
Utopia em lilás

Todos meus anjos de vidro
Saídos
De algum papel
Perguntam se venho de um livro
Um filme ou uma simples
Cama de motel
Com o meu corpo cansado
De tanto rasgar
Pedacinhos do céu

Todos meus anjos da guarda
Que nada!
Eles também são reais
Com facas e garfos à mesa
Esperando a comida
Salivando iguais
Pra poder na madrugada
Regurgitar sonhos
Feito uns canibais

Todos meus anjos de barro e vidro
Molhados
E já dissolvidos
E eu andando por vielas
Buscando a mais bela
Que me dê sentido
Com minha alma absorta
Entre velhos comas
E novos infinitos

E eu com a auréola no peito
Sujeito a alguma
Nuance qualquer
Procuro algum novo sujeito
Que me dê a chance
De encontrar a fé

Um anjo caído na Terra
Perdido entre a guerra
E a lata de lixo
Prostrado em frente aos carros
Catando cigarros
Ou um outro vício

E eu com no peito a aurora
Esperando a hora
De ser jogada fora

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Letra antiga de música, que é pra ver se Naipe Em Braile volta à ativa.

escrito ao som de Isaac Hayes - Shaft

sábado, maio 07, 2005

Sonhos de Consumo

Ontem, na Maratona, vagando sozinho feito fantasma com uma latinha de cerveja pelos saguões e entradas do Odeon - onde, por sinal, não gostei de nenhum dos filmes, apesar da experiência lisérgica de ver Godzilla com os rolos trocados, fora de foco, cópia dando pau o tempo todo ser no mínimo interessante, isto é, até eu dormir profundamente - decidi ser menos exigente. Em vez de uma namorada - ser utópico é bom até encher o saco -, estou com um novo sonho de consumo: um mp3 player. É, a situação está mesmo preta...

escrito ao som de Marvin Gaye - What's Going On

sexta-feira, maio 06, 2005

Alfabeto

a bunda
abunda
a avenida

bélica
bólica
búlica

carne
corpo
cu

a bunda
desbunda
a alma

dona
duna
dunba

a bunda
é

e
eu


escrito ao som de Supergrass - I Should Coco

quarta-feira, maio 04, 2005

Cinemanifesto

Tô pensando em fazer um manifesto cinematográfico, sabe como é, eu tenho que fingir que a faculdade de cinema serve pra alguma coisa. Mas então, resolvi virar radical. Contra o bom mocismo das formas, a favor dos palavrões. Quero um cinema raso, rápido, superficial. Sem roteiro hiper-desenvolvido, personagens hiper-profundos, planos hiper-pensados. Só com atores toscos e mulheres gostosas que aceitem fazer o teste do sofá e ficar nua em cena sem problema. E, principalmente, muito, muito humor. Que me perdoem os puristas, mas escracho é fundamental. Enfim, uma câmera na mão, uma idéia na cabeça, sujeira na boca e muita vontade no peito. Menos Walter Salles e mais Carlos Reichenbach. Sabe cinema marginal?

Por falar no Carlão, tá rolando uma mostra sensacional com quase toda a obra do cara no CCBB. Duas sessões por dia, seis e oito. Amanhã, as duas são raríssimas. Na primeira, um compêndio dos curtas do cineasta. Na segunda, uma versão inédita de Amor, Palavra Prostituta, com 10 minutos anteriormente cortados pela censura. Estudantes de cinema da Uff, principalmente, podem aproveitar essa bobagem de Universidade Aberta e correr pro cinema, é de graça. E se você não for estudante da Uff também não tem problema. Compra o cinepasse que é baratinho. Enfim, leitor(a), não tem desculpa para faltar. Tô te esperando lá amanhã. Não quero ir ao cinema sozinho novamente...

escrito ao som de Astor Piazzolla - Historia del Tango

terça-feira, maio 03, 2005

Se a última noite já tiver sido...

Se a última noite já tiver sido
Meu corpo inteiro, podre e consumido
Esquecerá um dia, sem querer.

E nesse dia, a alma já liberta
Encontrará na vida alguma fresta
Para de novo e de novo morrer.

escrito ao som de Wilson Simonal - Alegria Alegria vol. 2