terça-feira, outubro 25, 2005

a outra

depois de mais uma madrugada insone, triste, sozinha; de passar pelos canais de televisão esperando que algum trouxesse qualquer espécie de remédio; de sentir o corpo se afogando, sem volta, na cama, no chão, na parede, o corpo se afogando e desaparecendo pelo quarto inteiro; de pensar em cortar os pulsos, tomar remédios, se tacar pela janela; de começar a escrever uma carta de adeus, dessa vez definitiva, diferente de ontem, ou anteontem, ou das milhões de outras cartas; depois de socar o próprio peito algumas vezes esperando que batesse mais forte, ou mais devagar, ou mesmo parasse de bater – mas que não batesse mais por ela, por favor – ele decidiu. não bateria.

quando, nos dias, e meses, seguintes, a encontrava, virava os olhos, se escondia. quando ela vinha lhe cumprimentar, balbuciava algo de incompreensível, e fugia. quando rolava – às vezes rolava – de reconhecerem-se em algum bar, sentava no canto oposto das mesas, e sofria. e de sofrer muito, sofrer incomensuravelmente, sofrer simplesmente – que a palavra sofrer já basta -, de sofrer foi vivendo. até que, em uma manhã de chuva, manhã como todas as outras manhãs o são, ele acordou sorridente. e, então, ao se encontrarem, ele disse oi, ela disse oi, ele disse tenho que ir, e foi.

antes de chegar em casa, com a alma, e a cabeça, e o corpo descansados, com a vida em ordem e as coisas no lugar, decidiu tomar uma cerveja, sozinho, enfim sozinho, para comemorar. foi quando viu uma outra, qualquer outra, outra outra, uma nova outra passar.

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